domingo, 3 de maio de 2009

LOURA FANTASMA ERA CHAVE DE CADEIA


Telmo Wambier, hoje na Petrobras, conta a história abaixo, que aconteceu na reportagem geral do Globo, nos anos 70.
“Num desses plantões de domingo em que não acontece nada além do futebol, o editor Iran Frejat quebrava a cabeça para fechar a última página da Editoria Rio. Já tinha usado todas as matérias de gaveta e o que sobrava era lixo. Como o Sarmento tinha escrito a décima cascata sobre a “Loura Fantasma”, um personagem horroroso inventado pela imprensa, que assustava as crianças nos colégios, achou uma solução:
– Zé Mário, liga pro juiz de menores e veja se arranca alguma coisa dele sobre essa mulher que ataca as crianças no banheiro dos colégios.
Embora o Zé Mário fosse um sujeito disciplinado não conseguiu dissimular o mau humor.
– Pô, Frejat. Essa cascata já foi longe demais...Você quer que eu pergunte o quê? Incomodar o juiz num domingo pra isso?
– Sei lá, Zé Mário. Pergunta se ela é gostosa, qualquer coisa. Você não é repórter? As crianças estão assustadas. Tem uma psicologia, aí....
– Mas Frejat....
– E faz foto, dele. Tenho um buraco de meia página pra tapar.
Frejat não era de desistir. E o Zé Mario sabia disso. Não teve outro jeito senão procurar o telefone do juiz no catálogo telefônico.
Ligou:
– Boa tarde! Por gentileza, eu poderia falar com o doutor fulano? (Acho que era Alzheimer, o nome, não lembro).
Combinou a entrevista e saiu, fotógrafo a tiracolo. Voltou com o mesmo sem-saco com que foi e escreveu três laudas de entrevista. Era quase um tratado sobre a loura fantasma. Considerações sobre o pânico das crianças, o risco de haver uma desequilibrada rondando os colégios, cuidados que os pais deveriam tomar...Uma catilinária.
– Eu não disse que rendia? – disse o Frejat, quando o Zé Mário entregou a matéria.
No dia seguinte o Globo saia com uma foto em três colunas. O entrevistado de sunga, deitado ao lado da piscina, copo de uísque à mão, e a matéria embaixo. Não deu outra.
Frejat foi acordado às seis da manhã pelo Dedé, secretário de redação da madrugada. E o Zé Mário às seis e cinco. Não era o juiz. O entrevistado de sunga, bebericando um uisquinho, era um homônimo. Um corretor de imóveis gozador, que morava na Barra da Tijuca e que devia estar rolando de rir àquela hora.
Como era de esperar, o juiz ficou furioso. Ameaçou processar o repórter, o corretor, o jornal. Exigia uma explicação.
– Liga pra porra desse cara agora, Zé Mário! Diga que o juiz e o jornal vão meter um processo em cima dele. Você pelo menos guardou a porra da fita com a entrevista desse filho da puta? – berrava o Frejat.
A defesa do entrevistado foi perfeita. Ligaram para a casa dele e perguntaram se era o doutor fulano. Era. Se tivessem perguntado se era juiz, claro, diria que não. Queriam uma entrevista sobre um assunto que só conhecia pelos jornais. Disse que talvez não fosse a melhor pessoa para ser ouvida, que não sabia nada de louras fantasmas. Mas como o repórter insistiu...Estava tudo gravado. “Toca aí a fita e veja se eu disse em algum momento que era juiz”.
Nem o jornal, nem o juiz, nem o Frejat podiam fazer nada. Barriga!”.

3 comentários:

edu h disse...

O que os alunos de hoje em dia mais querem no banheiro é uma loura, mesmo que seja fantasma...

Olga de Mello disse...

Lapidar. Me escangalhei de rir, Zé Sérgio!

implacavel disse...

Muito boa essa...